sexta-feira, novembro 04, 2005

Acordava atirada contra um céu vermelho, em sangue, e dizia, Este dia não foi hoje, como se o tempo, acordado no fim de um segundo, pudesse preferir as horas mortas de sol às horas de luz que se repetem ao anoitecer, como se estas lágrimas que choras hoje te dissessem e gritassem que estás aqui, que me queres, que não choras mais e engoles as lágrimas com os teus olhos antes que elas te caiam pela cara. Não foi hoje este dia, foi o que disseste, mas houve nesse suspiro, breve, uma quase-dor, um murmúrio mortiço que revelava um abraço, outros sons, maiores talvez, mais pequenos por certo, sem forma nem compasso, de certeza. Era o dia que nascia, repetiste, não repetiste, não sei já o que disseste, e foi como um dia que acabasse para mim, mais perto de ti, desse céu vermelho, de sangue já não sei, não me lembro. De encontro ao teu sorriso, sem hipótese de fugir, acabo por sorrir também, sem forçar os músculos, esses que fazem sorrir, e acabo por ficar, de certeza que não vou querer fugir, com os pés rentes aos teus pés, com o corpo rente ao teu corpo, minha boca rente à tua boca, o meu sol rente ao téu sol, a minha lua, a tua, a nossa. E esse vento que passa por ti e passa por mim vem em silêncio, está parado, dorme nas folhas das árvores, está no teu cabelo, andará por aí, não sabemos, não o ouvimos, vem dali, não sabemos nem saberemos nunca, vem daqui, vem de lá, talvez, mas vem em silêncio, não fala, não diz, mas espera, espera que falemos, espera que me digas, com os teus pés rentes aos meus pés, com o teu corpo rente ao meu corpo, com a tua boca rente à minha boca, o teu sol rente ao meu sol, e espera que eu diga, já disse com o quê rente a quê, o vento espera que digas e que eu diga, Volta para mim.

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