segunda-feira, março 29, 2004

Despedida

Direi apenas ao despedir-me:
Adeus, até ao meu regresso...
Partirei enfim distante, sem destino,
para a encruzilhada do Nada,
para o encruzamento do Ser,
da imensidão infinita do interior de todos nós.
Partirei enfim, distante...
Quem ficar, ver-me-á afastando-me
para sempre, talvez, ou para voltar a correr,
chorando ao vento lágrimas pesadas.
Partirei sozinho: não preciso de ninguém ao pé.
Quero ir sozinho, sozinho.
Quero a aventura imaginária isolado de mim,
buscando aquilo que sou,
ou o que todos somos, indiferentes a todos,
retrospectivando as expressões superficiais,
nesses magníficos Dias Atlânticos.
Partirei, pois. Partirei sozinho
e direi apenas ao despedir-me:
Adeus, até ao meu regresso...
E que não seja breve o regresso...
Que fique em mim sempre a ânsia de viver,
a ânsia de procurar, de ver-me crescer.
Que fique em mim sempre o Desejo...
Esse desejo das noites de Inverno,
O simples Desejo, o simples desejar...

Mas não queria fazê-lo sozinho...
Eu quero desejar contigo,
a teu lado somente, contigo...

Mas não, não tenho coragem de te pedir.
Não i­as querer, não tu.
Eu não te amaria, desejar-te-ia apenas.
Por isso não te levo comigo: deixa-te ficar
Meu anjo... não, não te vou acordar..
Despeço-me de ti com um olhar,
um olhar basta... diz tudo.
Direi, pois, ao partir:
Adeus, até ao meu regresso.

revejo, relembro agora...
Percorro a memória com a própria memória.
Reconstruo um puzzle sem peças,
um muro sem pedras,
uma ponte sem pilares...
Mas afinal, que faço eu?
Não seremos todos
um puzzle sem peças,
um muro sem pedras,
uma ponte sem pilares?
Que é a existência do ser senão
um resumo do Nada?
O que é?

(Não... não tentes perceber,
não tentes... o que importa é esquecer.)

Esquece tudo, e recomeça.
Esquece tudo, e revive.
Esquece tudo, e verás.
Dirás, então, como eu, ao partir,
chorando as lágrimas pesadas
de que te falei:
"Adeus, até ao meu regresso..."
E assim é esquecer,
esquecer é partir, para sempre,
para o vazio do Ser,
para o vazio de Nós...